Sermão sobre contracepção

quarta-feira, 15 de maio de 2013





Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave Maria…


“Filhas de Jerusalém, não choreis sobre mim, mas chorais sobre vossos filhos. Porque eis que virá um tempo em que se dirá: Ditosas as estéreis e ditosos os seios que não geraram e os peitos que não amamentaram.” (Lc XXIII, 28-29)

 

     Eis aqui a única referência que Cristo faz à contracepção e à mentalidade contraceptiva. Claro que essas palavras de Nosso Senhor são suscetíveis de várias interpretações e se aplicam a circunstâncias diversas, em particular ao momento da queda de Jerusalém e mesmo ao fim dos tempos. Mas é claro que Nosso Senhor se refere, aqui, também à contracepção e à mentalidade contraceptiva. E Ele o faz no meio de seus maiores sofrimentos, durante a Via Sacra. Durante toda a história da humanidade nunca vimos um período em que a contracepção estivesse tão disseminada como em nossos tempos. É preciso chorar, nos diz Nosso Senhor.

     A Igreja tem o direito e o dever dados por Deus para julgar sobre a moralidade dos atos e esse poder da Igreja em relação à moral se estende à Lei Natural, à explicação da Lei Natural. Esta lei decorre da própria natureza das coisas, a lei que decorre da própria natureza do homem, criada por Deus. Nós vemos que Deus formou nossas faculdades de um certo jeito e que, consequentemente, elas devem ser usadas segundo a intenção do Criador, se não quisermos ofendê-lo e prejudicar a nós mesmos.  Em outras palavras, Deus nos fez de um certo modo e isso traz para nós consequências de como devemos agir. De forma semelhante, quando se fabrica um carro, o fabricante o faz de uma certa maneira, tendo em vista seus objetivos. Assim, ele pode fabricar um carro que funciona somente com gasolina. Ora, se alguém vai contra a intenção do fabricante e coloca álcool no tanque de combustível, o carro terá vários problemas e não funcionará corretamente como deveria, se tivesse sido observada a intenção do fabricante.

     Dentre as faculdades que Deus deu ao homem, há a faculdade reprodutiva. E Ele formou tal faculdade de forma que dois aspectos dela sejam inseparáveis. No ato conjugal devem se encontrar necessariamente juntos os aspectos unitivo e procriativo. O elemento unitivo consiste no fato de que o ato conjugal, por sua própria natureza, faz do homem e da mulher uma só carne, unindo-os fisicamente. O aspecto unitivo não é aqui o amor entre os cônjuges, mas a união que faz deles uma só carne. O elemento procriativo consiste no fato de que o ato conjugal, por sua própria natureza, está fundamentalmente ordenado à procriação. Assim, esses dois aspectos do ato conjugal não podem nunca separar-se. Se alguém os separa irá gravemente contra a lei natural e, portanto, contra Deus, autor da lei natural. É de suma importância compreender isso: o aspecto unitivo e o aspecto procriativo não devem ser separados. Deus quis que os filhos fossem gerados por meio da união que se realiza no ato conjugal. E essa união pelo ato conjugal só se justifica quando tal ato é feito sem excluir a procriação.

     Essa doutrina imutável da Igreja nos leva a algumas conclusões importantes. Ela condena, por exemplo, a fertilização in vitro e a inseminação artificial, pois aqui o aspecto unitivo é deixado de lado. A Igreja é defensora da família e dos filhos, mas não a qualquer custo. Os fins não justificam os meios. A Igreja não pode ir contra a lei natural, contra Deus, para favorecer a procriação. Essas práticas que deixam de lado o aspecto unitivo vão gravemente contra a lei natural, feita por Deus, e são objetivamente um pecado grave.

     Outras consequências decorrem da doutrina da Igreja. Ela significa que uma pessoa não pode ser esterilizada a fim de evitar os filhos: ligadura das trompas e vasectomia são gravemente proibidas e também os que recomendam esses procedimentos e os médicos que os realizam cometem grave pecado. Esses procedimentos, sendo possível, devem ser revertidos, se o casal ainda se encontra em idade fértil. Preservativos e qualquer outro tipo de barreira artificial, como diafragma, por exemplo, também não são moralmente lícitos. Também as pílulas não podem ser tomadas, evidentemente, para evitar os filhos. E vale destacar que essas pílulas não somente impedem a gravidez, como podem causar aborto, impedindo a fixação do embrião na parede uterina, por exemplo.

     Em 1968, o Papa Paulo VI, na Encíclica Humanae Vitae, confirmou o ensinamento constante e imutável da Igreja tanto em relação aos dois aspectos do ato conjugal que não podem ser separados quanto à proibição dos métodos anticoncepcionais.

     Outra, porém, é a avaliação moral dos assim chamados métodos naturais, quer dizer, aqueles em que o casal reduz o uso do matrimônio aos dias inférteis da mulher. Em relação aos métodos naturais, é preciso dizer que é perfeitamente lícito o ato conjugal no período infértil, pois nesse caso a infertilidade não decorre da vontade dos cônjuges, mas da própria natureza. Assim o ato conjugal é lícito quando a infertilidade é natural, decorrente, por exemplo, do ciclo da mulher ou da idade. Todavia, embora os métodos naturais sejam em si moralmente lícitos, eles não podem ser usados por razões de contracepção ou por uma mentalidade contraceptiva, quer dizer, para evitar os filhos a todo custo ou para reduzir o número de filhos a um número que seja agradável para o casal.

     Para utilizar os métodos naturais de forma moralmente aceitável, é preciso que haja razões graves para que uma nova gravidez não aconteça. Destaco bem: são necessárias razões graves. Essas razões graves podem ser de ordem médica, eugênica, social, econômica. De ordem médica, física ou psicológica, por exemplo, se uma nova gravidez traz riscos sérios para a saúde da mãe. De ordem eugênica, por exemplo, se a probabilidade de o filho nascer com problemas ou deficiências é grande ou se há grande probabilidade de aborto espontâneo. De ordem social, por exemplo, se o governo aborta sistematicamente as crianças de um casal após o nascimento do primeiro, como é o caso na China. De ordem econômica, se o nascimento de mais um filho colocará os pais em situação econômica realmente difícil, por exemplo.

     As razões de ordem econômica devem ser graves: o não conseguir dar o melhor colégio ou a melhor comida para o filho não são razões graves. O ter de comprar um carro pior ou ter de baixar o status econômico também não são razões graves. Tem-se exagerado muito a questão econômica para justificar o uso dos métodos naturais. Repito: a razão econômica deve ser realmente grave. Como podem surgir muitas dúvidas sobre o saber se uma razão é ou não suficiente para a utilização dos métodos naturais, é preciso consultar um padre de segura doutrina moral. Pio XII diz: “se essas graves razões (para utilizar os métodos naturais) não estão presentes, a vontade de evitar habitualmente a fecundidade da união, mas continuando a satisfazer plenamente a sensualidade, só pode derivar de uma falsa apreciação da vida e de motivos alheios às retas normas éticas”.

     Resumindo, utilizar os métodos naturais sem ter uma razão realmente grave para tanto, é moralmente ilícito, é pecaminoso e deriva de uma mentalidade contraceptiva que precisa ser evitada, pois, além de ser em si pecaminosa, termina conduzindo à contracepção de fato. Além disso, para que os métodos naturais sejam utilizados é preciso que os dois cônjuges estejam de acordo, pois tais métodos supõem a abstenção do ato conjugal durante um certo período e isso não pode ser feito sem que o dois estejam de acordo, até para não dar lugar a tentações contra o matrimônio. O casal pode usar os métodos naturais para aumentar a chance de filhos, evidentemente. Podem, mas isso não é obrigatório, Ninguém está obrigado a ter o maior número possível de filhos, mas, sim, a aceitar todos os filhos que Deus enviar como fruto do uso normal do matrimônio.

     A contracepção e a mentalidade contraceptiva são hoje praticamente onipresentes. E, infelizmente, mesmo entre os católicos. A crise atual é de fé e moral. E as consequências são drásticas, lastimáveis e graves. A primeira consequência é, claro, para o próprio casal que vê a vida matrimonial naufragar. A recusa da primeira finalidade do matrimônio, que é a procriação, trará grandes prejuízos para o casal. A contracepção faz que homens e mulheres sejam vistos como objetos para fins sexuais. Mas a contracepção e a mentalidade contraceptiva causam também graves problemas na sociedade. O problema do aborto está diretamente ligado à contracepção. Ora, o objetivo da contracepção é fazer de tudo para praticar o ato conjugal sem ter filhos. Com essa mentalidade contraceptiva os filhos passam a ser vistos como inimigos do casal.  Mas, e se os métodos anticoncepcionais falharem? Ora, a gravidez vai contra a intenção de ter filhos, então, é preciso fazer um aborto. Depois se segue o infanticídio, pois se eu posso matar a criança na barriga da mãe, por que não posso matar assim que ela nascer? E isso já está sendo proposto em alguns países: o aborto pós-parto, quer dizer, o assassinato da criança depois de nascida. E tudo isso é lógico, pois o crime é o mesmo – o assassinato de um bebê – só muda o lugar e o momento. A que ponto chegamos, caros católicos?

     A chamada paternidade responsável por meio do uso da contracepção é, na verdade irresponsável e causa a irresponsabilidade. Ela é irresponsável, pois a pessoa quer justamente praticar um ato sem arcar com as consequências naturais de seu ato. Isso é o que se chama irresponsabilidade. E se a irresponsabilidade é defendida em matéria tão fundamental e básica, é claro que ela vai se propagar para outros domínios da vida. Não é por acaso se as pessoas e a sociedade tem se tornado cada vez mais irresponsáveis.

     O próximo passo, depois do aborto, é a eutanásia. A razão para não ter crianças é o fato delas serem um peso, um fardo. O passo seguinte é, então, eliminar os idosos que se tornam igualmente inconvenientes. Uma vez que o princípio por traz da contracepção – isto é, o prazer sem responsabilidades e a eliminação de tudo o que pode ser inconveniente – foi aceito, as consequências lógicas chegam, mais cedo ou mais tarde. E depois dos idosos, serão eliminados da sociedade todos aqueles que ela de alguma forma acha que são inconvenientes, que são um peso. E isso começa, por exemplo, com o aborto dos fetos anencefálicos. Nossa sociedade tão moderna e tão evoluída faz com muito mais perfeição o que fazia a Alamenha nazista de Hitler. Nós vemos, então, que a contracepção está na raiz da cultura da morte e podemos enxergar claramente a gravidade da contracepção e da mentalidade contraceptiva. E notem que, historicamente, a cultura da morte, de fato, começa com a contracepção, em seguida passa ao aborto, depois vem a eutanásia, e, finalmente, a eliminação de todos os que são considerados um peso por essa sociedade degenerada. Tudo foi muito bem organizado pelo inimigo do homem. É preciso notar também que quando uma sociedade se torna contraceptiva, há um aumento da homossexualidade, pois a contracepção indica que a finalidade das nossas vidas é o prazer sensual. E se a finalidade é essa, qualquer forma de prazer desse tipo se torna válida. Tudo está ligado, caros católicos.

     É preciso, portanto, ficar longe da contracepção, da mentalidade contraceptiva e de todas as suas consequências. A nossa atitude face aos filhos deve ser como a de Nossa Senhora: “faça-se em mim segundo a vossa palavra”. Os três bens do casamento são os filhos, a fidelidade e a indissolubilidade, O maior deles, porém, são os filhos. Os filhos não são um peso e não são um mal. Ao contrário, eles são a alegria e a glória dos pais. O casal deve estar sempre aberto a todos os filhos que Deus quer enviar e não podem evitá-los nunca por métodos anticoncepcionais e só poderão fazê-lo utilizando métodos naturais se houver razões graves para isso, como dissemos. Nesse assunto, reitero, é preciso consultar um padre que tenha segura e sólida doutrina moral.

     Aquele filho que o casal quer evitar – sem ter uma causa grave para tanto – é o filho que, talvez, nos planos de Deus iria mudar a família, como São Bernardo, que levou para a vida religiosa mais de trinta familiares. Ou talvez o filho que o casal queira evitar seja aquele que pode trazer grandes benefícios para a sociedade. Pode ser o santo de que nossa época tanto precisa. É preciso confiar também na providência divina. Se Deus manda um filho aos pais que permanecem fiéis e generosos, ele dará os meios para que os pais possam, cooperando com a graça divina, educar o filho e ajudá-lo a se salvar. Deus não pode nos pedir nada que seja impossível. Mas é preciso também recorrer a Ele. Grandes graças estão reservadas para o casal que confia na providência divina, aceitando todos os filhos que Deus manda.

“Faça-se em mim segundo a vossa palavra.”
Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.

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